CARMEM LÚCIA FOSSARI
(1954) poeta catarinense é mestre em Literatura Brasileira pela UFSC com opção
em Teatro, diretora de espetáculos do DAC - Departamento Artístico Cultural da
UFSC, diretora e fundadora do grupo de pesquisa Teatro Novo. Escreveu, encenou
e dirigiu várias peças que foram premiadas. Publicou Heresia(2011) após testar
a receptividade de seus poemas em blogs e sites da internet.
POEMA PARA FERNANDO
ARRABAL
Uma borboleta voou desde
as ferrugens
dos carros de teu
cenográfico mundo
de tantos que o gestastes
em teu sangue espanhol
do confronto, do teu
exílio e retorno ao páis
que te deu três irmãos
d.arte, naquilo que a familiaridade
nas identidades de quem
rompe e reinventa
os traduzem,
por isto digo-os teus
irmãos
aqueles que a linguagem,
em igual
visceralidade tua,moeram
as confortáveis
imagens e palavras e
destruindo-as emergiram ao novo,
obrigando-nos redescobrir
angulações do olhar e
do pensamento.
Dali, um salvador
onírico,
picasso, um pablito dos
poblitos que choraram nele
quando pintou guernica, e
tu
fernado, de madre filho de
carmen
do pai que a ideologia te
roubou a ti
dos afagos, dos beijos e
carinhos
e tu que da palavra
edificastes uma florestas de páginas impressas
ao drama aquarelastes o
teu humor
de olhares de todos os
peixes
nadando nas aquosas bocas,
babilonicas
arquiteto da não
arquitetura, o revoltoso sem armas
o capaz de embriagar-se a
falar com o deus
em ejaculatórias de rios
nascentes do oceano
arrabalesco de tuas
imagens , multiplas de ti mesmo
voando sobre uma jogada de
xadrez
cavalgando o touro da
infancia que sempre volta
Depois que tomado de
sangue e tempo,
te escorrem do peito as
palavras com que nos colocas a coroa de espinhos
nesta cruz de vivermos em
solidão do existirmos assim tão desprotegidos,
embora as armas e as
guerras possam sob tua arte virarem um pic nic.
Arrabal de coração menino
de afetos e afagos aos que te leem mais atentamente
provocas o pánico aos
resistentes defensores
da ordem estabelecida
hierárquica… Tu não a credulas
e nos abençoas ao milagre
de
podermos por ti
esquecermos as absolutas certezas
os absolutos sentimentos e
nos permitirmos a dádiva da dúvida,
da inquietação.
Tu és o terceiro espanhol,
forjado na espanha pós guerra civil
e todo o pó e lágrimas se
uniram em argila
onde esculpes na solidão
humana,a ferida aberta
por habirtamos aos tempos
de uma torre de babel.
Canto para ti, porque
acendes o amor , que lorca tão bem o cantou,
mas tu, o acendes em
fogueira ,
que são muitas,
crepitantes chamas
queimando nossas entranhas
em fogo pánico
para que não nos
esqueçamos, que na brevidade , não cabe nenhum poder,
sim desafiarmos , todos
eles, anarquicamente.
Desde nosso mais íntimo
forum patafísico, que o humor é a única ponte que atravessa o medo, o terror
e tatua ao desejo que a
vida é uma flor que mastigamos
em viver, mas reservo para
ti as pétalas rubras
que a emoção de ler-te as
perfilam num colar da palavra
liberdade.
POESIA À FEDERICO GARCÍA
LORCA
Em ternura tuas palavras
Ainda ressoam
Ecos, e, se tuas
As palavras
Porque desvendas e,
Por teu sentimento
Revelam-se, são nossas
As palavras
Que precisamos ouvir
E evocam também as
Nossas “veias abertas”
E, então vem à cena:
“ LA BARRACA”
Nos bairros e vilas
camponesas
Eis o lazer pensante,
Chegando cedinho
Antes mesmo que a
Nova ordem social
Traga:
Sopa quente
A todas as mesas!
O teu Teatro, chegou
Trazendo vida à quem
Tem que ter esperanças!!
E,o outro tempo, que
Também passará...
Há de chegar breve,
E vai soprar nos ouvidos
Em sussurros
LIBERDADE
(carícia comum)
Olho agora teus olhos
Negros,
Tão negros e belos
Que não conheci,
Mas que os vejo, emergem
Impressos, fotografias
E, eles ainda falam
Mesmo, depois de serem
fuzilados,
se alam do papel memória
e,
Contam as nossas
incontáveis
Desesperanças.
Só estes teus versos
fortes
movimentam e penetram
E dizem que a força do
trabalho
De sol a sol, dos homens,
das mulheres,
E (que horror) das
crianças,
Silenciam gritos!
Só eles falam à todos nós
De que é inabalável o
movimento
Do movimento
Que chega da força
coletiva
Para que este mundo, do
não
Seja ontem.
Agora choras porque te
roubam
A tua vida
E os teus olhos negros se
fazem silêncio.
S i l ê n c i o
Mas as nossas vozes de
trabalho, não te silenciam
E, gritamos ensurdecidas,
ensurdecidos, até que
Por tuas palavras
resgatamos
Que há outro caminho, por
onde caminhamos
E caminhamos em ti
abraçados
LORCA, LORCA!
....Continuamos.
TRAVELLING
Minha vida em viagem
etiquetada
Sob a mala que transporta
Mundo afora
Tantos mundos
De meu ser
Que já nem sei
Quando minhas mãos de
Espanto e surpresa
Retiram da bagagem
Mala aberta
Outros livros de poesias
já nascidas
A bagagem de poemas já bem
sei
Estão antes de ser e inda
depois
Seguirão em viagem sem
retorno
E noutras mãos e destinos
seguirá
A mala com outras
etiquetas de destino
Em deslocamento segue, um
pouco de ausência,
Outro tanto de presença
Mais ainda de presente em
futuro almejando
A rota da viagem
vislumbrar
E, da poesia que emerge
mala aberta
Um doce ar perfuma
As palavras e nelas,
Embrulhadas em fina lamina
Roça ao sangue em gotas
minha pele
Não sangra de meu ser mais
que a sensação
De ver pouco a pouco a
vida
A esvair-se.
Detenho de aspirar doce
perfume, do amor
Que muda todas as rotas
E faz eterna a nossa tão
pequena rota
Debaixo da mala etiquetada
Que ora segue em seu
destino de encontro.
VOLTEIO
Difusa imagem
retornas
escorrendo na taça
gota a gota
como numa parede
translucida
tuas palavras embebem
no vinho da memória
e te encostas na minha
epiderme
de saudades
Voilá!
RITA MOUTINHO (1951) poeta
cariosa, jornalista e pesquisadora, é formada em comunicação social pela
PUC-RIO, colabora em jornais e revistas e orienta oficinas de poesia. Estreou
em 1975, com Hora Quieta, livro que teve muito boa repercussão crítica.
Seguiram-se A Traça(1982), Uma ou Duas Luas(1987), Vocabulário, Um Homem(1995),
Romanceiro dos Amantes (1999) e Sonetos dos Amores Mortos(2006).
A PAZ NÃO FAZ BARULHO
À noite nascem as horas de
viagem:
carrego o dia em bagagem
até o cimo
da falésia e lanço os
desatinos em mergulho.
Só então as límpidas águas
do escuro
alvam o futuro das
dissonâncias do dia.
O choro estia e durmo: a
paz não faz barulho.
VELEIRO
Posso ser veleiro,
mastro, parte ossificada,
velas, sensibilidade,
casco, verdade.
Não multiplico pães nem
peixes,
choro onde me sangram as
chagas,
singro humana pelos mares,
faço imagens, não
milagres.
Mas se você se fizer
veleiro,
eu andarei sobre as águas.
SONETO DUPLO PARA YANG E
YIN
A arte de amar nos nasce
espontaneamente,
é uma fonte que brota em
nosso corpo ermo,
é ímã que magnetiza,
acopla e inda freme
almas em cio, ímpares de
aconchego.
As carícias ebulem, há
licor pras sedes,
e lá se vão conversas e
sempre é cedo.
Paixão vem em torrente tal
vem o sêmen,
manifestam-se límpidos os
desejos.
Em distância os amantes
abrigam um ao outro,
não acontecem elipses, são
unidade,
cada encontro é viver
verdades do sonho.
Amar carameliza o olhar, e
uma clave
pauta as palavras ternas
do íntimo forno.
O estado de amar é um sol
escarlate.
A arte de desamar é árdua
e espinhosa,
é por um longo tempo
abraçar um cardo,
é como sair de uma dança
de roda
que no eixo tem roldana ainda
no passado.
Um maquinismo pára, o
corpo se ignora,
e o espírito procura
restaurar cacos
em rede neuronal, memória,
que adoça
com momentos azuis a hora
do cansaço.
Também cria-se um ódio,
põe-se uma laje,
e o sofrer se apresenta
menos penoso.
Não é. Há que enlutar,
sentir a dor da ave
que se privou de uma asa
em meio da viagem.
A arte de desamar dói, é
ir do eco ao oco,
dói admitir o fim de uma
eternidade.
SONETO DE UM SÁBADO
SURREAL
Tu, anjo do “Teorema” e
também bruxo,
cevada nas carícias, fel
na fala,
pastor de pedras, âncora
de surtos,
córrego azul, raposa,
avenca, magma.
Eu, certa belle de jour,
sal de soluços,
frasco de versos, útero de
asas,
peregrina das noites, nau
sem prumo,
alma de nácar, águia,
orquídea, calda.
Nas vísceras do oceano nos
amamos,
embarcamos um no outro
noite adentro,
espumando os delírios mais
insanos.
Depois, viraste tronco, e
eu, filodendro.
Amores podem ser longos e
poucos,
mas pelo menos um tem que
ser louco.
MARILDA CONFORTIN (1956)
poeta catarinense, prosadora, analista de sistemas e funcionária pública
aposentada, vive desde 1975 em Curitiba. Já ministrou várias oficinas deu
palestras e fez leitura pública de poesia em teatros, bares e praças.
Representou o Brasil em encontros de poesia no México, Nicarágua e Portugal. Em
novembro deste ano estará no XX Encuentro Internacional de Mujeres Poetas en el
País de las Nubes, Oaxaca, México. Publicou Busca e Apreensão(2010), Lua
Caolha(2008)
Gostosa!
Bela cantata!
Me allegro,
ma non treppo.
Per ver tendo te
Disseco-te
verso
per verso
Brinde
Poesia é uma Flor Bela que
Espanca,
golpeia, fere, maltrata.
Poesia quando ataca
provoca cirrose,
divórcio, neurose,
taquicardia, tuberculose…
Poesia mata!
Por isso, os grandes
poetas estão mortos.
Por isso, os poetas vivos
são assim tão… tortos.
Só loucos, vivem a poesia
em sua essência.
Em sã consciência,
a hipocrisia desta vida é
insalubre,
arde feito urtiga e é mais
fria
do que a vodka que
consumia Maiakowski.
Por isso eu ergo uma taça,
e faço um brinde:
A todos os malditos poetas
seres visceradis pelo
avesso,
não servis,
vis citados,
anônimos e abominados
que rabiscam e recitam
seus manuscritos
pelos botecos,
sebos,
saraus e feiras
livres prisioneiros da
poesia.
Aos benditos que publicam
e são lidos,
e aos ficam empoeirados,
empoleirados nas
prateleiras,
criando teia,
esperando que um dia
alguém os leia.
Aos que travestem a poesia
com barro,
tinta, efeitos virtuais,
acordes musicais
e cantam, pela vida sem
serem ouvidos.
Um brinde aos que partem
cedo,
com medo de verem suas
almas
sendo dissecadas por
críticos estúpidos.
Poesia é de quem precisa
dela, já dizia Neruda.
Se você não precisa,
não leia,
não ouça,
não toque!
Ela é como um feto:
precisa de calor e útero
e não de um fórcipe
obstetra.
E mais um brinde
A todos aqueles que atuam
à luz do dia,
nesse imenso palco,
de paletó, gravata, saia
justa, salto alto,
e esperam impacientes a
aposentadoria
para enfim, declarar seu
amor pela poesia.
A todos aqueles que,
entraram na fila errada,
e estão neste mundo por
engano
só para diversão dos
deuses.
Não escrevem, não cantam,
não esculpem nem declamam.
Mas sentem, amam e acolhem
anonimamente a poesia em
seus ventres.
Um brinde a todos os
recipientes!
Suicídio
Com agulhas de crochê
a velha senhora
mata horas.
CRISTINA BASTOS (1960)
nascida em Uberlândia, Minas Gerais, a poeta vive em Brasília desde 1972.
Formada em Educação Artística, exerce também as atividades de artista plástica
e fotógrafa. Participou de algumas antologias e publicou dois livros: Decerto
Deserto (1992) e Teia (2002). Segundo o poeta Salomão Sousa, assim que publicou
seu primeiro livro ela passou a ser considerada uma das importantes vozes da
nova poesia de Brasília.
Não importa
Não importa
se não comando
meu forte é ver navios
em sossego
sei sorver,
se sopra
brisas
se venta,
tempesteio.
Não importa
se sou mestre
em arrasar passados,
só no meu mapa
Mexo
é minha
a história que calo,
na loucura
sei sorver,
o mel, o veneno
do meu prato.
Limpidez
Quando
o profundo
não diz o máximo
com o mínimo
interdito
mesmo o emaranhado
pode ser sucinto
cristalino.
Qualquer Coisa
Vasa pela fresta
do vaso quebrado
o verbo,
não carece mais
que um insípido objeto
para ser
verso
transbordante
Aceito
Se estranha a teia
assimilo o asco
do desconhecido,
aranha enorme,
uma batalha disforme
entre verbo
e a garra do instinto
Rubens Jardim,
67 anos, jornalista e poeta. Foi redator chefe Gazeta da Lapa e
trabalhou no Diário Popular, Editora Abril e Gazeta Mercantil.
Participou de várias antologias e é autor de três livros de poemas:
ULTIMATUM (1966), ESPELHO RISCADO (1978)e CANTARES DA PAIXÃO (2008).
Promoveu e organizou o ANO JORGE DE LIMA em 1973, em comemoração aos 80
anos do nascimento do poeta, evento que contou com o apoio de Carlos
Drummond de Andrade, Menotti del Picchia, Cassiano Ricardo, Raduan
Nassar e outras figuras importantes da literatura do Brasil. Organizou e
publicou JORGE, 8O ANOS - uma espécie de iniciação à parte menos
conhecida e divulgada da obra do poeta alagoano. Integrou o movimento
CATEQUESE POÉTICA, iniciado por Lindolf Bell em 1964, cujo lema era: o
lugar do poeta é onde possa inquietar. O lugar do poema são todos os
lugares... Participou da I Bienal Internacional de Poesia de Brasília
(2008) com poemas visuais no Museu Nacional e na Biblioteca Nacional.
Fez também leituras no café Balaio, Rayuela Bistrô e Barca Brasília. E
participou da Mini Feira do Livro, com o lançamento de Carta ao Homem do
Sertão, livro-homenagem ao centenário de Guimarães Rosa. Teve poemas
publicados na plaquete Fora da Estante, (2012), coleção Poesia Viva, do
Centro Cultural São Paulo. Páginas na Internet: Site: Rubens Jardim e Facebook: Rubens Jardim
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