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AS MULHERES POETAS NA LITERATURA BRASILEIRA (24) [Rubens Jardim]

AS MULHERES POETAS NA LITERATURA BRASILEIRA (24)


CARMEM LÚCIA FOSSARI (1954) poeta catarinense é mestre em Literatura Brasileira pela UFSC com opção em Teatro, diretora de espetáculos do DAC - Departamento Artístico Cultural da UFSC, diretora e fundadora do grupo de pesquisa Teatro Novo. Escreveu, encenou e dirigiu várias peças que foram premiadas. Publicou Heresia(2011) após testar a receptividade de seus poemas em blogs e sites da internet.

POEMA PARA FERNANDO ARRABAL

Uma borboleta voou desde as ferrugens

dos carros de teu cenográfico mundo
de tantos que o gestastes em teu sangue espanhol
do confronto, do teu exílio e retorno ao páis
que te deu três irmãos d.arte, naquilo que a familiaridade
nas identidades de quem rompe e reinventa
os traduzem,
por isto digo-os teus irmãos
aqueles que a linguagem, em igual
visceralidade tua,moeram as confortáveis
imagens e palavras e destruindo-as emergiram ao novo,
obrigando-nos redescobrir angulações do olhar e
do pensamento.

Dali, um salvador
onírico,
picasso, um pablito dos poblitos que choraram nele
quando pintou guernica, e tu
fernado, de madre filho de carmen
do pai que a ideologia te roubou a ti
dos afagos, dos beijos e carinhos
e tu que da palavra edificastes uma florestas de páginas impressas
ao drama aquarelastes o teu humor
de olhares de todos os peixes
nadando nas aquosas bocas, babilonicas
arquiteto da não arquitetura, o revoltoso sem armas
o capaz de embriagar-se a falar com o deus
em ejaculatórias de rios nascentes do oceano
arrabalesco de tuas imagens , multiplas de ti mesmo
voando sobre uma jogada de xadrez
cavalgando o touro da infancia que sempre volta

Depois que tomado de sangue e tempo,
te escorrem do peito as palavras com que nos colocas a coroa de espinhos
nesta cruz de vivermos em solidão do existirmos assim tão desprotegidos,
embora as armas e as guerras possam sob tua arte virarem um pic nic.
Arrabal de coração menino de afetos e afagos aos que te leem mais atentamente
provocas o pánico aos resistentes defensores
da ordem estabelecida hierárquica… Tu não a credulas
e nos abençoas ao milagre de
podermos por ti esquecermos as absolutas certezas
os absolutos sentimentos e nos permitirmos a dádiva da dúvida,
da inquietação.

Tu és o terceiro espanhol, forjado na espanha pós guerra civil
e todo o pó e lágrimas se uniram em argila
onde esculpes na solidão humana,a ferida aberta
por habirtamos aos tempos de uma torre de babel.

Canto para ti, porque acendes o amor , que lorca tão bem o cantou,
mas tu, o acendes em fogueira ,
que são muitas, crepitantes chamas
queimando nossas entranhas em fogo pánico
para que não nos esqueçamos, que na brevidade , não cabe nenhum poder,
sim desafiarmos , todos eles, anarquicamente.

Desde nosso mais íntimo forum patafísico, que o humor é a única ponte que atravessa o medo, o terror
e tatua ao desejo que a vida é uma flor que mastigamos
em viver, mas reservo para ti as pétalas rubras
que a emoção de ler-te as perfilam num colar da palavra
liberdade.

POESIA À FEDERICO GARCÍA LORCA

Em ternura tuas palavras

Ainda ressoam

Ecos, e, se tuas
As palavras

Porque desvendas e,

Por teu sentimento

Revelam-se, são nossas

As palavras

Que precisamos ouvir

E evocam também as

Nossas “veias abertas”

E, então vem à cena:

“ LA BARRACA”

Nos bairros e vilas camponesas

Eis o lazer pensante,

Chegando cedinho

Antes mesmo que a

Nova ordem social

Traga:

Sopa quente

A todas as mesas!

O teu Teatro, chegou

Trazendo vida à quem

Tem que ter esperanças!!

E,o outro tempo, que

Também passará...

Há de chegar breve,

E vai soprar nos ouvidos

Em sussurros

LIBERDADE

(carícia comum)

Olho agora teus olhos

Negros,

Tão negros e belos

Que não conheci,

Mas que os vejo, emergem

Impressos, fotografias

E, eles ainda falam

Mesmo, depois de serem fuzilados,

se alam do papel memória e,

Contam as nossas incontáveis

Desesperanças.

Só estes teus versos fortes

movimentam e penetram

E dizem que a força do trabalho

De sol a sol, dos homens, das mulheres,

E (que horror) das crianças,

Silenciam gritos!

Só eles falam à todos nós

De que é inabalável o movimento

Do movimento

Que chega da força coletiva

Para que este mundo, do não

Seja ontem.

Agora choras porque te roubam

A tua vida

E os teus olhos negros se fazem silêncio.

S i l ê n c i o

Mas as nossas vozes de trabalho, não te silenciam

E, gritamos ensurdecidas,

ensurdecidos, até que

Por tuas palavras resgatamos

Que há outro caminho, por onde caminhamos

E caminhamos em ti abraçados

LORCA, LORCA!

....Continuamos.


TRAVELLING

Minha vida em viagem etiquetada
Sob a mala que transporta
Mundo afora
Tantos mundos
De meu ser
Que já nem sei
Quando minhas mãos de
Espanto e surpresa
Retiram da bagagem
Mala aberta
Outros livros de poesias já nascidas

A bagagem de poemas já bem sei
Estão antes de ser e inda depois
Seguirão em viagem sem retorno
E noutras mãos e destinos seguirá
A mala com outras etiquetas de destino

Em deslocamento segue, um pouco de ausência,
Outro tanto de presença
Mais ainda de presente em futuro almejando
A rota da viagem vislumbrar

E, da poesia que emerge mala aberta
Um doce ar perfuma
As palavras e nelas,
Embrulhadas em fina lamina
Roça ao sangue em gotas minha pele
Não sangra de meu ser mais que a sensação
De ver pouco a pouco a vida
A esvair-se.
Detenho de aspirar doce perfume, do amor
Que muda todas as rotas
E faz eterna a nossa tão pequena rota
Debaixo da mala etiquetada
Que ora segue em seu destino de encontro.


VOLTEIO

Difusa imagem
retornas
escorrendo na taça
gota a gota
como numa parede translucida
tuas palavras embebem
no vinho da memória
e te encostas na minha epiderme
de saudades
Voilá!




RITA MOUTINHO (1951) poeta cariosa, jornalista e pesquisadora, é formada em comunicação social pela PUC-RIO, colabora em jornais e revistas e orienta oficinas de poesia. Estreou em 1975, com Hora Quieta, livro que teve muito boa repercussão crítica. Seguiram-se A Traça(1982), Uma ou Duas Luas(1987), Vocabulário, Um Homem(1995), Romanceiro dos Amantes (1999) e Sonetos dos Amores Mortos(2006).

A PAZ NÃO FAZ BARULHO

À noite nascem as horas de viagem:
carrego o dia em bagagem até o cimo
da falésia e lanço os desatinos em mergulho.

Só então as límpidas águas do escuro
alvam o futuro das dissonâncias do dia.
O choro estia e durmo: a paz não faz barulho.

VELEIRO

Posso ser veleiro,
mastro, parte ossificada,
velas, sensibilidade,
casco, verdade.

Não multiplico pães nem peixes,
choro onde me sangram as chagas,
singro humana pelos mares,
faço imagens, não milagres.

Mas se você se fizer veleiro,
eu andarei sobre as águas.


SONETO DUPLO PARA YANG E YIN

A arte de amar nos nasce espontaneamente,
é uma fonte que brota em nosso corpo ermo,
é ímã que magnetiza, acopla e inda freme
almas em cio, ímpares de aconchego.
As carícias ebulem, há licor pras sedes,
e lá se vão conversas e sempre é cedo.
Paixão vem em torrente tal vem o sêmen,
manifestam-se límpidos os desejos.
Em distância os amantes abrigam um ao outro,
não acontecem elipses, são unidade,
cada encontro é viver verdades do sonho.
Amar carameliza o olhar, e uma clave
pauta as palavras ternas do íntimo forno.
O estado de amar é um sol escarlate.





A arte de desamar é árdua e espinhosa,
é por um longo tempo abraçar um cardo,
é como sair de uma dança de roda
que no eixo tem roldana ainda no passado.
Um maquinismo pára, o corpo se ignora,
e o espírito procura restaurar cacos
em rede neuronal, memória, que adoça
com momentos azuis a hora do cansaço.
Também cria-se um ódio, põe-se uma laje,
e o sofrer se apresenta menos penoso.
Não é. Há que enlutar, sentir a dor da ave
que se privou de uma asa em meio da viagem.
A arte de desamar dói, é ir do eco ao oco,
dói admitir o fim de uma eternidade.

SONETO DE UM SÁBADO SURREAL

Tu, anjo do “Teorema” e também bruxo,
cevada nas carícias, fel na fala,
pastor de pedras, âncora de surtos,
córrego azul, raposa, avenca, magma.
Eu, certa belle de jour, sal de soluços,
frasco de versos, útero de asas,
peregrina das noites, nau sem prumo,
alma de nácar, águia, orquídea, calda.
Nas vísceras do oceano nos amamos,
embarcamos um no outro noite adentro,
espumando os delírios mais insanos.
Depois, viraste tronco, e eu, filodendro.
Amores podem ser longos e poucos,
mas pelo menos um tem que ser louco.




MARILDA CONFORTIN (1956) poeta catarinense, prosadora, analista de sistemas e funcionária pública aposentada, vive desde 1975 em Curitiba. Já ministrou várias oficinas deu palestras e fez leitura pública de poesia em teatros, bares e praças. Representou o Brasil em encontros de poesia no México, Nicarágua e Portugal. Em novembro deste ano estará no XX Encuentro Internacional de Mujeres Poetas en el País de las Nubes, Oaxaca, México. Publicou Busca e Apreensão(2010), Lua Caolha(2008)


Gostosa!

Bela cantata!
Me allegro,
ma non treppo.


Per ver tendo te

Disseco-te
verso
per verso


Brinde

Poesia é uma Flor Bela que Espanca,
golpeia, fere, maltrata.
Poesia quando ataca provoca cirrose,
divórcio, neurose, taquicardia, tuberculose…
Poesia mata!
Por isso, os grandes poetas estão mortos.
Por isso, os poetas vivos são assim tão… tortos.
Só loucos, vivem a poesia em sua essência.
Em sã consciência,
a hipocrisia desta vida é insalubre,
arde feito urtiga e é mais fria
do que a vodka que consumia Maiakowski.
Por isso eu ergo uma taça, e faço um brinde:
A todos os malditos poetas
seres visceradis pelo avesso,
não servis,
vis citados,
anônimos e abominados
que rabiscam e recitam seus manuscritos
pelos botecos,
sebos,
saraus e feiras
livres prisioneiros da poesia.
Aos benditos que publicam e são lidos,
e aos ficam empoeirados,
empoleirados nas prateleiras,
criando teia,
esperando que um dia alguém os leia.
Aos que travestem a poesia com barro,
tinta, efeitos virtuais,
acordes musicais
e cantam, pela vida sem serem ouvidos.
Um brinde aos que partem cedo,
com medo de verem suas almas
sendo dissecadas por críticos estúpidos.
Poesia é de quem precisa dela, já dizia Neruda.
Se você não precisa,
não leia,
não ouça,
não toque!
Ela é como um feto:
precisa de calor e útero
e não de um fórcipe obstetra.
E mais um brinde
A todos aqueles que atuam à luz do dia,
nesse imenso palco,
de paletó, gravata, saia justa, salto alto,
e esperam impacientes a aposentadoria
para enfim, declarar seu amor pela poesia.
A todos aqueles que,
entraram na fila errada,
e estão neste mundo por engano
só para diversão dos deuses.
Não escrevem, não cantam,
não esculpem nem declamam.
Mas sentem, amam e acolhem
anonimamente a poesia em seus ventres.
Um brinde a todos os recipientes!

Suicídio

Com agulhas de crochê
a velha senhora
mata horas.


CRISTINA BASTOS (1960) nascida em Uberlândia, Minas Gerais, a poeta vive em Brasília desde 1972. Formada em Educação Artística, exerce também as atividades de artista plástica e fotógrafa. Participou de algumas antologias e publicou dois livros: Decerto Deserto (1992) e Teia (2002). Segundo o poeta Salomão Sousa, assim que publicou seu primeiro livro ela passou a ser considerada uma das importantes vozes da nova poesia de Brasília.

Não importa

Não importa
se não comando
meu forte é ver navios

em sossego
sei sorver,

se sopra
brisas
se venta,
tempesteio.

Não importa
se sou mestre
em arrasar passados,

só no meu mapa
Mexo
é minha
a história que calo,

na loucura
sei sorver,

o mel, o veneno
do meu prato. 

Limpidez

Quando
o profundo

não diz o máximo
com o mínimo 

interdito

mesmo o emaranhado
pode ser sucinto
cristalino.

Qualquer Coisa

Vasa pela fresta
do vaso quebrado 
o verbo,

não carece mais
que um insípido objeto 
para ser

verso
transbordante 

Aceito

Se estranha a teia
assimilo o asco 
do desconhecido,

aranha enorme,

uma batalha disforme
entre verbo 
e a garra do instinto


Rubens Jardim, 67 anos, jornalista e poeta. Foi redator chefe Gazeta da Lapa e trabalhou no Diário Popular, Editora Abril e Gazeta Mercantil. Participou de várias antologias e é autor de três livros de poemas: ULTIMATUM (1966), ESPELHO RISCADO (1978)e CANTARES DA PAIXÃO (2008). Promoveu e organizou o ANO JORGE DE LIMA em 1973, em comemoração aos 80 anos do nascimento do poeta, evento que contou com o apoio de Carlos Drummond de Andrade, Menotti del Picchia, Cassiano Ricardo, Raduan Nassar e outras figuras importantes da literatura do Brasil. Organizou e publicou JORGE, 8O ANOS - uma espécie de iniciação à parte menos conhecida e divulgada da obra do poeta alagoano. Integrou o movimento CATEQUESE POÉTICA, iniciado por Lindolf Bell em 1964, cujo lema era: o lugar do poeta é onde possa inquietar. O lugar do poema são todos os lugares... Participou da I Bienal Internacional de Poesia de Brasília (2008) com poemas visuais no Museu Nacional e na Biblioteca Nacional. Fez também leituras no café Balaio, Rayuela Bistrô e Barca Brasília. E participou da Mini Feira do Livro, com o lançamento de Carta ao Homem do Sertão, livro-homenagem ao centenário de Guimarães Rosa. Teve poemas publicados na plaquete Fora da Estante, (2012), coleção Poesia Viva, do Centro Cultural São Paulo. Páginas na Internet: Site: Rubens Jardim e Facebook: Rubens Jardim

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