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O poeta e a janela que
intimidava o fotografo
(Foto: Marcelo Buainain)
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"Fotógrafo
oficial" de Manoel de Barros passou a registrar o mundo
Anny Malagolini
Hoje com 51 anos, o
fotografo Marcelo Buainain carrega na profissão prêmios e muitos elogios, mas
uma das preciosidades que ganhou na vida foi a sorte de ter como vizinho o
poeta Manoel de Barros. Hoje, no Rio Grande do Norte, bem distante do Pantanal
de nosso poeta, Marcelo fala da vida e lembra do vizinho que o intimidava
quando morou na Rua Manoel Seco Tomé, no bairro Jardim dos Estados, há 20 anos.
Havia uma janela na casa
de Manoel, voltada para o jardim da família Buainain. Sem nunca ter visto quem
morava ao lado, o temor de ser uma pessoa estranha fez aquela parte da
residência ser menos usada, diz o fotógrafo. “Perdi a privacidade por conta da
janela, mas depois descobri a inocência dela”.
Mesmo ao saber de quem se
tratava, não ficou evidente a importância do fato. “Na época, o Brasil não
conhecia Manoel como conhecemos hoje”, revela. Marcelo havia trancado o quinto
período de Medicina na Universidade Federal do Mato Grosso do Sul e uma das
primeiras experiências profissionais como fotógrafo foi o trabalho para uma
revista espanhola, quando finalmente conheceu o vizinho e todo o mistério por
trás do muro se acabou.
"Estava a serviço da
revista espanhola El Paseante quando invadi o seu lugar de ser inútil para
fotografa-lo. Foi precisamente neste momento que enfim desvendei o mistério da
janela indiscreta, descobrindo que ela não representava ameaça alguma à minha
privacidade", relata em suas memórias virtuais.
Na época, Manoel de Barros
era conhecido por ser muito arredio. Mas ele permitiu a entrada do fotografo
não só como profissional, mas como amigo. Tímido, o poeta não gostava de flashes,
microfones, enfim, nada além da palavra escrita. Mas com a intimidade da
convivência que passou a ser frequente, ele conseguiu fazer o vizinho até
"posar". “Teve cumplicidade”, comenta.
A vontade era de
fotografar o Pantanal com os versos de Manoel de Barros, mas o tempo não gerou
uma oportunidade concreta e outros trabalhos ocuparam a vida.
Os trabalhos de Marcelo e
a "fotografia documental". (Foto: Marcelo Buainain)
Fotos feitas na Índia, por
Marcelo, viraram livro. (Foto: Marcelo Buainain)
Nas andanças, conheceu e
levou a imagem dos Yanomami à França. Na série “Amar é servir”, buscou as
expressões nos gestos das mãos para registrar uma das ações emblemáticas de
Irmã Dulce, o Hospital Santo Antônio, em Salvador.
Fez o mesmo sobre o
encontro entre a floresta e o homem, fotografando os rituais do Santo Daime.
Mostrou o que considera o lado perverso do Brasil no ensaio “ Cultura dos
Mutilados”, em mais um contraste entre a riqueza e a pobreza brasileiras.
Também conheceu o mundo
“De Paris para Lisboa, passando por Istambul”, e apresentou uma faceta dele em
18 fotos selecionadas para mostra da revista Veja.
No ano passado, Marcelo
expôs a série “Rasgo Brasileiro”, um arquivo analógico feito no final dos anos
90, em um quilombo da Bahia. Com a maioria dos projetos em preto e branco, só
esse ganhou cores.
Mesmo assim, a homenagem
ao negros teve como aliada a poesia do Manoel de Barros, baseada em um
fragmento do livro ‘Matéria de Poesia’ - “As coisas que não levam a nada, tem
grande importância [...] Tudo aquilo que nos leva a coisa nenhuma e que você
não pode vender no mercado”.
Sobre o aliado de uma vida
toda, ele ensina como nesse caso poesia e fotos foram união perfeita. “Na razão
obvia, peguei o material de acervo e apliquei a textura e linguagem do Manoel
em cima do material que tinha, afinal, os negros foram considerados
desimportantes”, explica.
Na década de 90, Marcelo
mudou-se para a Europa, em 2002 voltou para o Brasil e aqui também passou a
experimentar o audiovisual. Depois de mais de 50 exposições pelo mundo, 18
prêmios nacionais e internacionais, há 3 anos, a revista brasileira
PhotoMagazine incluiu Buainain entre os dez fotógrafos brasileiros da década.
Um reconhecimento ao sul-mato-grossense de família tradicional e vizinhança
privilegiada.
Fotografia pertence ao
único trabalho colorido do fotógrafo, o "Rasgo brasileiro". (Foto:
Marcelo Buainain)
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