A geração das selfies, likes
e mil seguidores
por Nathalí Macedo
Artigo publicado no site Entenda os Homens
Funcionava mais ou menos
assim: seus pais diziam que estava errado, você colocava na balança, usava o
filtro da razão, e formava a sua opinião. Mas você sempre ouvia.
Quando a sua avó dizia que
chá de boldo servia pra dor de barriga, você não pesquisava no Google pra ver o
embasamento científico daquilo – até porque, na época a qual me refiro, não
havia Google. Você bebia o chá de boldo pra ver se funcionava.
E não se tratava de
ignorância, síndrome da tia velha ou nada parecido. Era respeito à experiência
de vida do outro. Era o cultivo da arte de saber ouvir. Era a ideia de que o
outro sempre tem algo pra te ensinar, e que tuas verdades nunca são absolutas.
Hoje, na geração das
selfies, likes e seguidores, a coisa tá diferente. Todas as pessoas são
absolutas e autossuficientes porque seus posts têm não-sei-quantos likes.
Porque entendem sobre um monte de coisas que pesquisaram no Google.
Hoje, quem viu um
documentário sobre ditadura militar acha que pode falar de igual pra igual com
quem viveu a ditadura militar. O jovem lê o “Manifesto Comunista” e já se
considera absoluto entendedor da obra de Karl Marx. Fazem download de meia
dúzia de discos na internet e já se consideram grandes críticos musicais.
Toda sabedoria emanada da
experiência de vida é careta e absolutamente duvidosa se o Google diz o
contrário. Receitas de avó são ignoradas porque não são comprovadas
cientificamente.
Criamos um exército de
pessoas que sabem absolutamente tudo sobre qualquer coisa. Que estão tão cegas
em serem vistas, e admiradas, e ouvidas, e seguidas, e likadas, que deixam de
ouvir, de absorver, de crescer.
Estão tão concentradas na
própria sabedoria – insuficiente, na maioria das vezes – que ignoram a
sabedoria presente em cada coisa à sua volta. Que gastam um monte de minutos de
suas vidas tirando selfies enquanto há um mundo inteiro e belíssimo a ser
admirado, visto, fotografado. Mas o eu grita alto.
Quando desviamos o foco de
nós mesmos, nos abstemos de ser reis de nossas próprias verdades e aprendemos a
ouvir o outro, tornamo-nos cada vez mais conscientes do nosso papel no mundo.
Quando nos permitimos
enxergar as coisas sob outro ponto de vista – o ponto de vista de outra pessoa
– e valorizamos as lições que cada ser humano tem para nos ensinar, ganhamos
muito mais do que alguma maturidade: cultivamos a humildade sensata que é a
grande propulsora de nosso crescimento pessoal.
Quando tiramos a venda do
excesso de autoconfiança e trocamos a inteligência descartável pela sabedoria
da experiência, temos a oportunidade única de chegar onde de outro modo jamais
chegaríamos: na melhor versão de nós mesmos.
Nathalí Macedo
Atriz por vocação, escritora
por amor e feminista em tempo integral. Adora rir de si mesma e costuma se dar
ao luxo de passar os domingos de pijama vendo desenho animado. Apesar de tirar
fotos olhando por cima do ombro, garante que é a simplicidade em pessoa. No
mais, nunca foi santa. Escreve sobre tudo em:
facebook.com/escritosnathalimacedo
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