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Sebastião Veloz – “Do Formão ao Formato” [Prof. Dr. Laudenir Antônio Gonçalves]

Sebastião Veloz – “Do Formão ao Formato”

Guarantã do Norte, Mato Grosso.

Veloz! Não no sentido do patronímico recebido por Sebastião, comum em nosso país, mas sim, no sentido do adjetivo “veloce“, de dois gêneros, que vem do Latim e significa: 1 – que se movimenta ou desloca a grande velocidade; rápido, ligeiro; 2 – que passa muito depressa (dias v.). Sebastião: derivado do grego sebastós, que significa divino, venerável. Na Umbanda, de tradição afro-brasileira, o Orixá “Oxóssi” é sincretizado como São Sebastião. Oxóssi é o grande defensor das florestas e das relações entre o reino animal e vegetal. Grande caçador, comumente é representado nas florestas caçando com seu arco e flecha.

Abri esta apresentação a partir da interpretação da “nominação” do artista porque, quando um nome é dado a uma pessoa, ele se transforma em uma identidade. A partir de sua história, fica muito evidente a relação entre nome e indivíduo. Isto porque o nome dado pelos pais para os seus filhos refletem de alguma forma a relação futura entre seu nome e identidade. É ele que nos dará o sentimento de sermos únicos, de termos uma identidade própria. Quando conheci em 1997, imediatamente, o que mais me chamou a atenção foi algumas das características descritas acima, expressas em seu modo de andar, em movimentos e até na forma de falar. Hoje, a interpretação do nome de Sebastião como o Orixá Oxóssi, como defensor da floresta, mais do que nunca, está encarnada no artista.

Sujeito e reprentação fundem-se em um só objeto, materializam-se por meio de suas esculturas. Sua matéria-prima – a madeira – recolhe a esmo, do meio da floresta, do cerrado, de onde quer que seja. Ao reaproveitá-las, estetizando-as em objetos artísticos, o artista transforma-se no “grande defensor da floresta”. Essa e outras questões serão retomadas ao final do texto. Sebastião Veloz tem um currículo invejável, com exposições agendadas no Brasil e nos Estados Unidos, pois seu amadurecimento pessoal, depois de muitos anos de luta, está refletido em seu trabalho, que cresceu muito em qualidade.

Para escrever este texto, conversamos muito a respeito de sua trajetória, de seu sonho em se tornar “artista”, das dificuldades econômicas e dos problemas relacionados às suas relações familiares. Portanto, passo a descrever alguns fatos e eventos que foram determinantes para a trajetória, registrados por mim na forma escrita. Sebastião Veloz nasceu em 31 de Janeiro de 1961 na Cidade de Governador Valadares, Minas Gerais. Desde 1985 Sebastião Veloz dedicou-se ativamente a arte, e nunca mais parou. De 1985 até 1989 Veloz desenvolveu, apresentou e vendeu suas obras no Estado de Rondônia. Em 1990 buscando expandir mais seu trabalho, foi para o Estado de Mato Grosso. Rondonópolis foi à cidade escolhida por ele, onde residiu até novembro de 2000. Neste período que morou em Rondonópolis, foi convidado a participar de várias exposições em Minas Gerais, São Paulo, Espírito Santo e no Sul do País. No início do ano de 2000 Veloz recebeu um grande convite para expor suas peças nos Estados Unidos. E assim sendo, em Novembro de 2000 embarcou para o exterior e lá viveu por seis anos. No final de 2006 ele retornou ao Brasil, e escolheu o Portal da Amazônia para dar seguimento aos seus projetos.

O Ateliê Arauna – “Do Formão ao Formato”, foi criado com o objetivo inicial de realizar 50 esculturas, o projeto está em andamento, e os 25 trabalhos que ficaram prontos estão expostos em Guarantã do Norte, Sinop, Cuiabá e neste momento, na UFMT de Rondonópolis.

Veloz sempre teve no seu íntimo a inquietação pulsante e criadora, que corre incessantemente em suas veias, como os grandes artistas. E essa grande qualidade está incorporada à sua vida, desde quando o conheci. Seu trabalho sempre foi figurativo e expressam valores telúricos, míticos e místicos, de diferentes formas, e nos remetem à cultura regional ou à cultura popular. Seu imaginário também se manifesta por meio das obras antropomórficas, como “Anjo”, ou “Nascendo do Nada”, entre outras.

Na forma como o artista trabalha, explicita se a ligação com a interpretação inicial de seu nome. Se Oxóssi é o defensor da floresta, então é aquele que faz a ligação entre o mundo animal e vegetal. Os trabalhos de Veloz expressam exatamente esta ligação. Trabalha só com madeiras nobres (mundo vegetal) e materializa, por meio da estilização, formas vegetais e humanas (mundo animal). Para além da beleza e da fruição estética que seus trabalhos nos proporcionam, intrinsecamente, expressam, por si sós, a denúncia e o massacre que o homem está provocando na natureza, e dessa forma, destaca-se o papel político do artista (Oxóssi), engajado na defesa da natureza, da floresta e do planeta.

Em relação ao tamanho e à dimensão das obras, a princípio, o impacto é grande. Impressiona. Mas, vivendo em “Guarantã do Norte”, Portal da Amazônia, em um Estado que tem dimensões continentais, como o artista pode dar conta ou pode capturar e expressar toda essa espacialidade? Como captar e representar uma natureza tão exuberante e milenar como a floresta amazônica? São questões complicadas, que talvez não respondam, suficientemente, em relação ao tamanho e a dimensão das obras. Isto não é problema e nem temos aqui, a intenção de resolvê-las. O importante a destacar é que, apesar do tamanho e das dimensões, após o primeiro impacto, em poucos minutos percebemos e sentimos muita delicadeza em suas obras, por intermédio de algum detalhe, do polimento e, principalmente, por meio da forma. O que inicialmente nos impressionou, transforma-se em obras que nos confortam, pois, são aconchegantes. Ao mesmo tempo elas nos instigam, nos desafiam a refletir sobre o que representam, e nos convidam a decifrá-las.

Alguns teóricos e críticos de arte afirma que o artista sempre está “antenado com o seu tempo…”. Apesar dos problemas dessa teoria, acredito que ele está, pois suas obras expressam, sim, esse momento histórico que vivemos. Não só os problemas com o meio ambiente, pois vai muito além, aborda, também, um dos problemas fundamentais da cultura brasileira: a cultura do desperdício! O Brasil é o país do excesso, da abundância e do desperdício, enquanto a maioria da população sofre com a pobreza. Não reciclamos e não reaproveitamos quase nada. Tudo se perde… no nada. E, novamente, o trabalho do artista se faz presente, de forma exemplar, pois trabalha só com “reaproveitamento de material lenhoso”, ou seja, não retira nada da natureza, apenas coleta o que ela mesma descartou e transforma em obras de arte.

Nesta exposição, pela primeira vez trilha por novos caminhos e nos apresenta trabalhos geométricos, beirando ao abstrato. Isso demonstra que está à procura de novas formas para se expressar, talvez, a partir de novas pesquisas ou de um diálogo com a geometria e a física. E isso é muito saudável, pois, é nesse momento que a “arte e a ciência” se aproximam, posto que ambas têm a função de criar. Na criação do novo, na invenção, está a produção do conhecimento, que ampliará o repertório cultural do homem.

Essa nova busca que modifica e altera suas formas, reflete o seu amadurecimento pessoal e artístico, pois não tem medo do risco que significa “mergulhar no novo, no nada”, sem saber o que vai acontecer. E esse é o verdadeiro artista, sempre em busca de uma nova criação. E é isso o que importa. Não importa se o seu trabalho é figurativo ou abstrato, e nem o seu tamanho, se é grande ou pequeno. O importante é que, independente do tamanho, a obra se realize como objeto artístico, que nunca deixe de provocar questionamentos, que possibilite a fruição e a contemplação estética. Nesse sentido, seu trabalho se realiza de forma esplêndida.

Para finalizar, em tempo de globalização e de regionalização das comunicações, seu trabalho aponta para novos caminhos e, como afirma a caríssima crítica de arte, Aline Figueiredo, “… se o mundo é redondo, qualquer ponto, portanto é ponto”. E assim, Sebastião Veloz encontrará o seu próprio caminho, autônomo, e voará por esse mundão de Deus.


Prof. Dr. Laudenir Antônio Gonçalves- Docente no Departamento de História da UFMT, campus de Rondonópolis, Mestre em Ciências Políticas com a dissertação, Artes Plásticas na UFMT: um caso de expansão regional das artes plásticas e doutor em Antropologia, com a tese Produção Plástica Regional: campo artístico, produtores obras, ambas pela PUC/SP.

Fonte:
http://www.espacorecriar.com/cultura/sebastiao-veloz-do-formao-ao-formato/

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