Saber ouvir… uma arte…
Conta a história que um casal tomava café da manhã no dia de suas bodas de prata.
A mulher passou a manteiga na casca do pão e o entregou para o marido, ficando com o miolo.
Ela pensou: “Sempre quis comer a melhor parte do pão, mas amo demais o meu marido e, por 25 anos, sempre lhe dei o miolo.
Mas hoje quis satisfazer meu desejo.
Acho justo que eu coma o miolo pelo menos uma vez na vida”.
Para sua surpresa, o rosto do marido abriu-se num sorriso sem fim e ele lhe disse:
– Muito obrigado por este presente, meu amor. Durante 25 anos, sempre desejei comer a casca do pão, mas como você sempre gostou tanto dela, jamais ousei pedir!
Você precisa dizer claramente o que deseja, não espere que o outro adivinhe… Você pode pensar que está fazendo o melhor para o outro, mas o outro pode estar esperando outra coisa de você… Deixe-o falar, peça-lhe para falar e quando não entender, não traduza sozinho. Peça que ele se explique melhor. Desta forma, em nossos relacionamentos, homem/mulher, entre pais e filhos, entre amigos, entre colegas de trabalho, devemos ter em mente que a liberdade de pensamento e a liberdade de expressão são duas invioláveis direitos inerentes ao ser humano. Invioláveis porque são direitos naturais. Mas o exercício do pensar e do expressar estão, ontologicamente, dentro de uma outra lógica: a arte de saber ouvir. Essa arte de ouvir é difícil, especialmente quando a pessoa perdeu o contato com o silêncio de seu coração e, de outro lado, sempre se considera cheia de razão. E, por isso, só tem valor o que pensa e o que lhe interessa. Menospreza e desvaloriza outros pensarem, ainda que cheios de virtudes.
Isso é catastrófico ao homem e às suas relações interpessoais. E por quê? Porque não o deixa ouvir o conteúdo real das palavras, não o deixa pensar com a pureza do silêncio e, por isso, perde o sentido da arte de saber ouvir. O não saber ouvir leva ao desastre de não saber pensar e ao melancólico resultado de não saber se expressar. Acaba não havendo comunicação interativa. E as conseqüências disso, regra geral, são as incompreensões, são as desavenças e o afastamento do outro. Isso que isola o homem de si mesmo e dos outros.
A arte de ouvir não se confunde com o mero escutar. Quem sabe ouvir tem sempre o espírito aberto ao seu próprio silêncio. E à voz do outro. Ou seja, pacientemente ouve o outro como ouve o seu próprio coração. A arte de saber ouvir é, antes de tudo, o respeito ao pensamento e à expressão do outro, ainda que não comungue com aquele pensar.
Eis, precisamente, a questão para a qual o evangelista Tiago chamava a atenção: “(…) todo homem deve estar pronto para ouvir, ser tardio para falar e tardio para se irar”. O evangelista Tiago deixou um legado para a humanidade: a capacidade de ouvir e como natural resultado, promover a comunicação através dela, promover o reencontro com o silêncio do próprio coração.
A arte de saber ouvir é, pois, uma virtude. Exercitá-la é um gesto de coragem que deve ser cultivado diariamente. Disso resultará o verdadeiro princípio da liberdade de pensamento e da liberdade de expressão, pois esses princípios são caros à tolerância das idéias contrárias e caras ao cultivo do respeito à dignidade humana.
A arte de ouvir exercita a virtude da tolerância – virtude que revela outra virtude: a sabedoria, bem vivida por muitos homens sábios e tão bem como expressada pela cultura árabe: “se o que você vai dizer não é mais belo que o silêncio, não diga”, Ou como disse o escritor Rubens Alves: “Somente sabem falar os que sabem fazer silêncio e ouvir”. “É no vazio da jarra” – ensina a filosofia oriental – “que se colocam as flores”. Assim posso concluir: ouvir o silêncio não é ouvir o nada. Nem ficar tateando no vazio. É ouvir e entender o conteúdo real por trás da palavra, na voz ou na escrita do outro, com a mesma intensidade sincera que se ouve o próprio coração. E, então, começaremos a entender o significado dos princípios ao respeitoso exercício da liberdade de pensamento e da liberdade de expressão – filhos naturais da arte de saber ouvir, e, essa mãe da tolerância, a virtude que precisa ser mais exercitada.
E como nos diz Fernando Pessoa… “Às vezes ouço passar o vento… e só de ouvir o vento passar, vale a pena ter nascido…”.
As relações humanas seriam melhores se entendêssemos isso!!!
Um comentário
Infelizmente em nossas relações vivemos problemas como deste casal, que passaram anos enganados quanto as prefer6encias à mesa.
Mínimas coisas atrapalham tanto e impedem qe sejamos mais leves em nosso viver.
Muito importante esta análise.Parabéns!
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