Paulo
Tedesco
A
direita mais emperdenida é obrigada a aceitar que o Brasil evoluiu nesses mais
de dez anos de governo de esquerda. Evoluiu e a cada dia dá sinais e mais e
mais precisar de cabeças e mão-de-obra para sustentar seu crescimento, afinal
não se fazem nações ricas sem trabalho dos seus; as nações que enriqueceram com
rapidez sem trabalho como alicerce, a exemplo de Portugal e Grécia, afundaram
em crises que somente serão revertidas quando o trabalho, a indústria, a
produção interna reocuparem o espaço da preocupação de seus líderes. Enquanto
durar o festim com empréstimos lastreados em sacrifícios de seus trabalhadores,
ilusões neoliberais com lucros escorados em títulos podres e sobretudo
desindustrialização de seu país, – e digo que o Brasil ainda passa por esse
risco, contraditoriamente ao nosso recente crescimento –, países como Portugal
e Grécia, e muito possivelmente Espanha e Itália, embora esses tenham um perfil
diferenciado, ainda trarão surpresas políticas no cenário internacional seguidas
de muito desespero de sua população.
Certo,
o leitor que venceu o árido tema e chegou a esse parágrafo, se pergunta, e daí?
E a cultura em tudo isso? Não me demorarei em falar de economia da cultura e
sobre o que nos chega sobre os danos a nações tão ricas culturalmente, como
essas que se aprofundam em crises. Procurarei me ater tão somente à cultura
do trabalho, sim, isso, cultura do trabalho, algo que nos é tão caro hoje em
dia.
Após
décadas de crise, nosso Brasil nutriu e cultivou as tais loterias que nos
tornariam milionários por obra de pequenas apostas e aleatórios números da
sorte, chegando ao ápice de criar uma instituição nacional e absolutamente
ilegal como o jogo do bicho. Este que ainda se perdura e é encontrado com
freqüência dividindo espaço e lotéricas reconhecidamente oficiais. A exemplo
das loterias, outras “loterias” nessas décadas perdidas invadiram os sonhos de
riqueza e estabilidade do brasileiro, entre elas, ouso falar nas premiações de
programas “reality shows”, jogador de futebol, para os meninos, e manequim do
mundo da moda, para as meninas. Ah, ia-me esquecendo dos já praticamente
extintos bingos e caça-níqueis, para os que vivem de aposentadorias.
Mas,
jogador de futebol, manequim, “reality shows” e bingos, não tem trabalho? Tem,
e muito, a questão é que poucos jogadores de futebol enriquecem ainda meninos,
poucas meninas enriquecem na tenra idade, e os “realitys” são majoritariamente
apresentações televisivas bem arranjadas, com atores ou candidatos a atores
pagos e outros orientados a figurar num teatro pré-elaborado, simplesmente para
“aparecer na TV”. Nos bingos, por fim, é sabido que ganhar, assim de verdade,
um em cima do outro, somente seus agora banidos donos. Um número expressivo de
brasileiros que sonha ver seu filho trazer-lhe riqueza numa das três primeiras
opções, ou aqueles que não têm filhos, sonham em tornar-se ricos imiscuindo-se
nesses sonhos de fortuna onde vicejam corpos novos e belos, e com isso reforçam
a miséria humana de nossa época, esses todos esses, notadamente são fruto do
abandono à cultura do trabalho; onde somente o trabalho dignifica e somente o
trabalho nos traz riqueza.
Não
existe livro clássico sem trabalho do escritor, da editora, dos livreiros; não
existe riqueza consistente sem trabalho, inclusive para se manter essa riqueza,
para se falar no caso dos herdeiros afortunados; enfim, não existe país rico
sem população onde viceje a cultura do trabalho, o reconhecimento do trabalho
como eixo central de sua realização enquanto povo, enquanto nação. O resto,
leitores e leitoras, o resto é ilusão, desvio, mentira, para que alguns lucrem
trabalhando intensamente para que muitos outros não trabalhem e lhes sustentem
com loterias, bolinhas milagrosas, ligações telefônicas com votos e opiniões,
com ilusões de que basta chutar uma bola ou ter um rosto e um corpo bonitinho
que o resto irá, naturalmente, acontecer.
Paulo Tedesco é escritor
premiado em concursos de poesia entre os anos de 1996 e 1998 pelas
prefeituras municipais de Farroupilha e Caxias do Sul. Residiu em Fort
Lauderdale / Flórida, Estados Unidos, onde colaborou intensamente com
jornais e sítios eletrônicos da comunidade brasileira. Atualmente
participa na Oficina Literária Charles Kiefer em Porto Alegre/RS, cidade
onde exerce a profissão de consultor gráfico-editorial
www.oficinadolivro.net.br/
www.facebook.com/oficinadolivro/info
Nenhum comentário
Postar um comentário