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Marilyn Monroe & Arthur Miller: felizes para sempre ou até que a morte os separe [Vitor Dirami]
De 1956 a 1961 a maior
estrela de Hollywood da época foi casada com um dos principais dramaturgos
norte-americanos do século XX. Saiba agora um pouco mais sobre o romance de
Marilyn Monroe e Arthur Miller.
Marilyn conheceu Miller em
agosto de 1951, em Los Angeles, no set de filmagens de Sempre Jovem (As Young
As You Feel), quando ele apareceu por lá junto do diretor Elia Kazan. Marilyn
ainda era uma estrela em franca ascensão, enquanto Miller, bem, já era Arthur
Miller. A emoção do primeiro encontro foi descrita por ele anos depois como
"O choque de sentir a corrente elétrica, uma sensação tão incoerente com a
evidente tristeza de Marilyn em meio ao glamour do lugar, à tecnologia e à
confusão de uma nova cena sendo filmada..."
Nascido no bairro do
Harlem, em Nova York, em novembro de 1915, o dramaturgo obteve seu primeiro
sucesso na Broadway com The Man Who Had All Luck, peça que lhe rendeu o Theater
Guild's National Ward e aclamação da crítica, apesar de ter saído de cartaz com
apenas seis apresentações realizadas. Miller também era romancista, e publicou
alguns anos depois seu primeiro romance, Focus, sobre o antissemitismo, sem
muito alarde. O primeiro grande sucesso no teatro só viria em 1947, com a
montagem de All My Sons no Coronet Theater, em Nova York. A peça foi dirigida
por Elia Kazan - diretor com quem Miller teve uma longa relação pessoal e
profissional - e conquistou o prêmio do New York Drama Critics Circle Awards,
além de dois Tony. A consagração máxima veio com a peça Morte de Um Caixeiro
Viajante (Death Of a Salesman) - estreada na Broadway em fevereiro de 1949,
também sob a direção de Kazan; foi seu trabalho mais famoso, pelo qual
conquistou o Tony por Melhor Peça e o Prêmio Pulitzer.
Quando conheceu Marilyn,
ele era casado com Mary Slattery e tinha dois filhos - Jane e Robert. Os dois
só se reencontrariam na primavera de 1955, quando a peça de Miller A View From
The Bridge estava em cartaz em Nova York. Marilyn simplesmente adorou a peça e
chegou a assisti-la três vezes. Apesar do sucesso no teatro, Miller enfrentava
grandes dificuldades na época em que começou a namorá-la. Perseguido pela House
Un-American Activities Committee (HUAC), ele era visto como um perigoso
intelectual de esquerda e simpatizante comunista. Nem uma coisa nem outra. A
história serviria para mostrar que Miller estava distante dos dois estigmas lhe
impostos pelo HUAC. Entretanto, naquela época, havia o macartismo e os
americanos viviam com medo constante do comunismo - uma espécie de síndrome do
pânico inflamada principalmente pela mídia e pelos próprios oficiais do
governo. Portanto, nem as celebridades de Hollywood escaparam da vigilância do
FBI, Marilyn foi uma delas.
A tensão entre Miller e o
HUAC aumentaria ainda mais depois da estreia de sua peça As Bruxas de Salém
(The Crucible) em janeiro de 1953. A peça era uma alegoria na qual comparava as
atividades da HUAC à caça às bruxas em Salém, e fora também inspirada na
experiência que o amigo de Miller Elia Kazan enfrentara ao se apresentar diante
da HUAC em 1952, quando delatou alguns nomes de ex-companheiros do Partido
Comunista. O episódio mais tarde serviria de inspiração para o aclamado filme
Sindicato de Ladrões (On the Waterfront). Por Miller ter rompido sua amizade
com Kazan, foi visto como solidário àqueles citador pelo diretor, e teve
recusada sua solicitação de passaporte para assistir à estreia da peça em
Londres. A situação só piorou com A View From The Bridge - cuja trama continha
um estivador que era informante de dois imigrantes ilegais, entre outras
semelhanças com a história de Sindicato de Ladrões. A resposta do HUAC seria
mais vigilância e assédio.
Miller foi finalmente
intimidado a apresentar ao House Un-American Activies Committee em Washington
D.C. no dia 21 de junho de 1956; o depoimento foi tedioso, sem que o dramaturgo
fornecesse informações relevantes, a não ser uma declaração bombástica, quando
falou a um repórter que queria ter seu passaporte de volta porque "Tenho
uma produção em vias de ser encenada na Inglaterra, e estarei lá com a mulher
que então será minha esposa", no que o repórter indagou se a mulher era
Marilyn, ele consentiu. Depois perguntou se ele iria escrever uma peça para ela
e a resposta foi um "não" meio desengonçado - "Eu gostaria. Mas
eu nunca fui capaz de escrever uma peça para quaisquer atriz". Quando um
jornalista perguntou a Marilyn se o casamento provocaria alguma mudança em sua
carreira, ela respondeu modestamente, como era de seu feitio: "Eu acho que
ele gostaria que eu fosse uma boa atriz, tão quanto eu gostaria de ser."
Entretanto, as dúvidas e
tristezas, que já existiam desde antes do casamento, continuaram. Marilyn era
uma mulher extraordinária, articulada e arguta, mas não via isso, era muito
insegura e tinha um sentimento de inferioridade muito grande. Se perguntava o
que aquele intelectual podia estar querendo com ela e sofria com isso, não se
achava suficientemente inteligente a ponte de corresponder às expectativas dele
e tinha medo que um dia ele simplesmente se desencantasse dela. Mas apesar de
tudo, estava apaixonada por ele. Marilyn era toda ouvir e receber, ele falar e
dar. Era fascinada por Miller e ele ficava encantado com o carinho e afeição
que ela demonstrava ter pelas suas palavras - que ela parecia beber, uma à uma.
Mesmo que tivesse dúvidas
quanto a sua decisão, Marilyn acreditava e queria que aquele casamento desse
certo. Quando se uniu a Miller tinha 30 anos de idade recém completados, vinha
de dois outros casamentos que não deram certo e não queria que a nova união
fosse mais um fracasso em sua vida. Estava disposta a se tornar uma atriz
respeitada e Miller a apoiava nesse intuito, portanto, tinha mais do que
motivos para querer ser uma boa esposa e mãe. Precisava que sua vida desse
certo, tinha a necessidade urgente de esquecer o passado triste e ser feliz.
Miller pouco ou nada pode
fazer por Marilyn. Não pode salvá-la da ruína emocional que ela viveu nos
últimos anos de sua vida. Talvez tenha se arrependido de ter se casado com ela,
talvez o encanto realmente tenha se quebrado cedo demais. Muito tem sido escrito
sobre os quatro anos que passaram juntos, mas um fato interessante é que nestes
quatro anos, o período que durou o casamento com Marilyn, o dramaturgo não
conseguiu escrever uma peça de teatro sequer; teria sido o caos?
Enquanto Arthur enfrentava
o bloqueio criativo, Marilyn encarava sua vida pessoal indo por água abaixo. O
casamento desgastado rápido demais já se mostrava mais um fracasso. Os dias
felizes do casal nos primeiros meses de 1957, quando apareceram juntos em
cândidas sessões de fotos de Richard Avedon e Sam Shaw, estavam contados; em
julho de 1957 Marilyn descobriu que estava esperando um filho de Arthur, infelizmente,
algumas semanas mais tarde descobriu se tratar de uma gravidez ectópica. A
perda do bebê serviu para lançá-la em uma das piores depressões de toda sua
vida. O casamento havia sido um erro, fracassara como esposa, agora, com a
gravidez mal sucedida julgava-se incapaz de ser mãe, somado a isso, havia se
desinteressado pela carreira e se entregado completamente à bebida e aos
comprimidos. A situação melhoraria um pouco - brevemente - quando em outubro de
1958 descobriu que estava grávida novamente, o que foi motivo de felicidade
para ela, que sentiu que poderia recomeçar mais uma vez. Contudo, em 16 de
dezembro, Marilyn sofreu um aborto espontâneo, um abalo que foi tão forte
quanto o anterior; após se submeter a uma série de exames para determinar se
era possível ou não ter filhos, foi confirmado que ela jamais poderia ser mãe.
Marilyn não trabalhou em 1959, estava triste demais, uma tristeza que nunca
parecia ter fim.
Mas afinal, quem era
Marilyn Monroe para Arthur Miller? Teria sido Marilyn sua musa, ou sua vítima?
Miller não é um personagem muito bem quisto entre os estudiosos da vida da
atriz, porém a análise de duas obras do dramaturgo - um roteiro para o cinema e
uma peça de teatro - nos dão algumas respostas acerca da visão do autor sobre
sua ex-esposa. O roteiro de Os Desajustados (The Misfits) foi a única coisa que
Miller escreveu durante os quatro anos que ficou casado com Marilyn, era um
roteiro adaptado de um conto que ele escrevera para a revista Esquire em 1956.
Ele conta em sua autobiografia Timebends (1987) que escrevera a peça como um
presente para ela, bem, se foi assim mesmo, tratava-se de um presente bem
amargo que Marilyn logo passou a odiar. A trama girava em torno de Roslyn Taber
(Monroe) atriz que vai a Reno para obter o divórcio e hospeda-se na casa de
Isabelle Steers (Thelma Ritter), que a acompanha à corte como testemunha no
processo de divórcio. Comemorando num bar, conhecem Guido (Eli Wallach) e Gay
(Clark Gable) um caubói velho mas bonitão por quem se apaixona. Em breve os
dois se mudam para a casa que Guido está construindo. Assim como Gay, ele
também se apaixona por Roslyn. Guido tem um plano de capturar alguns cavalos
selvagens, chamados mustangues, impróprios para montaria por serem considerados
pequenos demais, e vendê-los. Com eles nessa empreitada está Perce (Montgomery
Clift) um peão de rodeio sem sorte e sem destino. Então, os três, acompanhados
por Roslyn partem para o deserto de Nevada, e só quando chega lá ela descobre o
destino dos animais: serão vendidos para um fabricante de ração para cachorro.
Roslyn se desespera e implora a Gay que liberte os seis cavalos, inicialmente,
ele se recusa e só depois de uma longa sequência corta as cordas e liberta os
mustangues. O ato serve para reaproximá-los, que começam a construir um futuro
juntos.
Marilyn achava aquela
personagem, uma mulher frágil e carente, uma caricatura dela mesma. De fato,
era um roteiro muito pessoal, onde Miller extraíra vários elementos da
personalidade real dela e do seu relacionamento. As semelhanças são evidentes.
Algumas falas de Marilyn neste filme parecem apenas repetições de sua própria
história. Ela se ressentiu, como se Arthur quisesse expor seu pior lado perante
todas. Mas apesar de hesitante aceitou fazer o filme, principalmente por causa
do alto nível dos profissionais envolvidos na produção. Certamente se
arrependeu dessa decisão durante as filmagens altamente estressantes. Os
Desajustados foi um erro. O comportamento errático de Marilyn no set era
atribuído à sua decadência física e psicológica, mas além disso o casamento
enfim chegava ao fim. O filme que seria o último trabalho completado de Marilyn
Monroe passaria em brancas nuvens - nem a direção de John Huston, nem o elenco
fabuloso, nem o roteiro de Arthur Miller salvaram Os Desajustados; o filme foi
retumbante fracasso. A crítica de filmes Leslie Halliwell escreveu: "Um
filme pretensioso e nada atraente, de dar pena". Muitos anos depois,
Arthur Miller basearia sua última peça teatral - Finishing the Picture (2004) -
no período que ele e Monroe gastaram filmando Os Desajustados.
A peça Depois da Queda
(After the Fall) dirigida por Elia Kazan, que estreou no Anta Washington Square
Theatre, em 23 de janeiro de 1964 - menos de dois anos depois da morte de
Marilyn - é um dos trabalhos mais pessoais do dramaturgo, um mergulho profundo
nas experiências vividas durante o casamento fracassado com Monroe. O enredo se
passa na mente de Quentin, um advogado de meia-idade que reflete sobre os
relacionamentos com as três mulheres de sua vida, e como terminou o casamento
com duas delas, o primeiro em divórcio, o segundo com o suicídio da esposa, uma
atriz e o terceiro ainda em andamento. A atriz suicida - Maggie - era
claramente baseada em Monroe, o que causou bastante mal-estar na época. Robert
Crustein escreveu numa crítica na revista New Republic: "Três horas e meia
de violação de bom gosto... Uma autobiografia confessional de franqueza embaraçosa...
Há uma tensão misógina na peça que o autor não parece reconhecer... Ele criou
um desavergonhado artigo de tabloide de fofocas, um ato de exibicionismo que
faz de todos nós voyeurs,... Um fragmento infeliz de escrita dramática." A
ex-primeira dama Jacqueline Kennedy, que era admiradora de Miller, também se
voltou contra ele por ter traído Marilyn em sua peça Depois da Queda. Para
Jackie, lealdade era a prova definitiva de caráter, e Miller falhara
miseravelmente retratando Marilyn como uma vagabunda autodestrutiva que ele
havia abandonado para o seu próprio bem. Depois da Queda permanece até hoje
como um dos trabalhos menos populares de Miller.
Arthur e Marilyn se
divorciaram no México, em 20 de janeiro de 1961. Cerca de um ano depois, em 17
de fevereiro de 1962, Arthur se casou com Inge Morath - fotógrafa dos quadros
da agência Magnum, que ele havia conhecido durante as filmagens de Os
Desajustados, enquanto ela cobria a produção do filme. Menos de seis meses
depois morria Marilyn Monroe. Como prova do espírito amável de Marilyn, foi o
pai de Arthur, seu ex-sogro, Isadore Miller - um homem que ela amava e chamava
de pai - o seu acompanhante na fatídica festa de aniversário do Presidente John
F. Kennedy em maio de 1962. Foi a última vez que Isadore, então com 77 anos,
viu Marilyn; ele morreria em 1964. Com Inge Morath Arthur teria ainda dois
outros filhos, a cineasta e atriz Rebecca Miller e Daniel, que nasceu com
síndrome de Down e foi excluído da vida diária da família pelo próprio pai, que
pôs o filho à guarda de uma instituição em Roxbury e nunca o visitou (embora
Inge Morath o fizesse); Miller não fala sobre Daniel nem em sua autobiografia
Timebends. O dramaturgo faleceu em 10 de fevereiro de 2005, vítima de
insuficiência cardíaca crônica.
Vitor Dirami
é a inquietação por
excelência, está sempre em busca do "algo a mais", e espera estar
levando um pouco mais de magia aos seus leitores.
Marilyn Monroe & Arthur Miller: felizes para sempre ou até que a morte os separe [Vitor Dirami]
Reviewed by Revista Biografia
on
abril 23, 2014
Rating: 5
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