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Marilyn Monroe & Arthur Miller: felizes para sempre ou até que a morte os separe [Vitor Dirami]

© Marilyn Monroe e Arthur Miller, Roxbury, 1957
 (foto de Sam Shaw).
Marilyn Monroe & Arthur Miller: felizes para sempre ou até que a morte os separe

por Vitor Dirami 

Artigo publicado no  Site: Obvious 

De 1956 a 1961 a maior estrela de Hollywood da época foi casada com um dos principais dramaturgos norte-americanos do século XX. Saiba agora um pouco mais sobre o romance de Marilyn Monroe e Arthur Miller. 

Marilyn conheceu Miller em agosto de 1951, em Los Angeles, no set de filmagens de Sempre Jovem (As Young As You Feel), quando ele apareceu por lá junto do diretor Elia Kazan. Marilyn ainda era uma estrela em franca ascensão, enquanto Miller, bem, já era Arthur Miller. A emoção do primeiro encontro foi descrita por ele anos depois como "O choque de sentir a corrente elétrica, uma sensação tão incoerente com a evidente tristeza de Marilyn em meio ao glamour do lugar, à tecnologia e à confusão de uma nova cena sendo filmada..."


© Marilyn Monroe e Arthur Miller, no aeroporto de Londres, 1956 (Britannica).

Nascido no bairro do Harlem, em Nova York, em novembro de 1915, o dramaturgo obteve seu primeiro sucesso na Broadway com The Man Who Had All Luck, peça que lhe rendeu o Theater Guild's National Ward e aclamação da crítica, apesar de ter saído de cartaz com apenas seis apresentações realizadas. Miller também era romancista, e publicou alguns anos depois seu primeiro romance, Focus, sobre o antissemitismo, sem muito alarde. O primeiro grande sucesso no teatro só viria em 1947, com a montagem de All My Sons no Coronet Theater, em Nova York. A peça foi dirigida por Elia Kazan - diretor com quem Miller teve uma longa relação pessoal e profissional - e conquistou o prêmio do New York Drama Critics Circle Awards, além de dois Tony. A consagração máxima veio com a peça Morte de Um Caixeiro Viajante (Death Of a Salesman) - estreada na Broadway em fevereiro de 1949, também sob a direção de Kazan; foi seu trabalho mais famoso, pelo qual conquistou o Tony por Melhor Peça e o Prêmio Pulitzer. 


© Marilyn Monroe e Arthur Miller, Roxbury, 1957 (foto de Sam Shaw).

Quando conheceu Marilyn, ele era casado com Mary Slattery e tinha dois filhos - Jane e Robert. Os dois só se reencontrariam na primavera de 1955, quando a peça de Miller A View From The Bridge estava em cartaz em Nova York. Marilyn simplesmente adorou a peça e chegou a assisti-la três vezes. Apesar do sucesso no teatro, Miller enfrentava grandes dificuldades na época em que começou a namorá-la. Perseguido pela House Un-American Activities Committee (HUAC), ele era visto como um perigoso intelectual de esquerda e simpatizante comunista. Nem uma coisa nem outra. A história serviria para mostrar que Miller estava distante dos dois estigmas lhe impostos pelo HUAC. Entretanto, naquela época, havia o macartismo e os americanos viviam com medo constante do comunismo - uma espécie de síndrome do pânico inflamada principalmente pela mídia e pelos próprios oficiais do governo. Portanto, nem as celebridades de Hollywood escaparam da vigilância do FBI, Marilyn foi uma delas. 

A tensão entre Miller e o HUAC aumentaria ainda mais depois da estreia de sua peça As Bruxas de Salém (The Crucible) em janeiro de 1953. A peça era uma alegoria na qual comparava as atividades da HUAC à caça às bruxas em Salém, e fora também inspirada na experiência que o amigo de Miller Elia Kazan enfrentara ao se apresentar diante da HUAC em 1952, quando delatou alguns nomes de ex-companheiros do Partido Comunista. O episódio mais tarde serviria de inspiração para o aclamado filme Sindicato de Ladrões (On the Waterfront). Por Miller ter rompido sua amizade com Kazan, foi visto como solidário àqueles citador pelo diretor, e teve recusada sua solicitação de passaporte para assistir à estreia da peça em Londres. A situação só piorou com A View From The Bridge - cuja trama continha um estivador que era informante de dois imigrantes ilegais, entre outras semelhanças com a história de Sindicato de Ladrões. A resposta do HUAC seria mais vigilância e assédio.


© Marilyn Monroe e Arthur Miller, Roxbury, 1957 (foto de Sam Shaw).

Miller foi finalmente intimidado a apresentar ao House Un-American Activies Committee em Washington D.C. no dia 21 de junho de 1956; o depoimento foi tedioso, sem que o dramaturgo fornecesse informações relevantes, a não ser uma declaração bombástica, quando falou a um repórter que queria ter seu passaporte de volta porque "Tenho uma produção em vias de ser encenada na Inglaterra, e estarei lá com a mulher que então será minha esposa", no que o repórter indagou se a mulher era Marilyn, ele consentiu. Depois perguntou se ele iria escrever uma peça para ela e a resposta foi um "não" meio desengonçado - "Eu gostaria. Mas eu nunca fui capaz de escrever uma peça para quaisquer atriz". Quando um jornalista perguntou a Marilyn se o casamento provocaria alguma mudança em sua carreira, ela respondeu modestamente, como era de seu feitio: "Eu acho que ele gostaria que eu fosse uma boa atriz, tão quanto eu gostaria de ser."


Entretanto, as dúvidas e tristezas, que já existiam desde antes do casamento, continuaram. Marilyn era uma mulher extraordinária, articulada e arguta, mas não via isso, era muito insegura e tinha um sentimento de inferioridade muito grande. Se perguntava o que aquele intelectual podia estar querendo com ela e sofria com isso, não se achava suficientemente inteligente a ponte de corresponder às expectativas dele e tinha medo que um dia ele simplesmente se desencantasse dela. Mas apesar de tudo, estava apaixonada por ele. Marilyn era toda ouvir e receber, ele falar e dar. Era fascinada por Miller e ele ficava encantado com o carinho e afeição que ela demonstrava ter pelas suas palavras - que ela parecia beber, uma à uma.

Mesmo que tivesse dúvidas quanto a sua decisão, Marilyn acreditava e queria que aquele casamento desse certo. Quando se uniu a Miller tinha 30 anos de idade recém completados, vinha de dois outros casamentos que não deram certo e não queria que a nova união fosse mais um fracasso em sua vida. Estava disposta a se tornar uma atriz respeitada e Miller a apoiava nesse intuito, portanto, tinha mais do que motivos para querer ser uma boa esposa e mãe. Precisava que sua vida desse certo, tinha a necessidade urgente de esquecer o passado triste e ser feliz.


Miller pouco ou nada pode fazer por Marilyn. Não pode salvá-la da ruína emocional que ela viveu nos últimos anos de sua vida. Talvez tenha se arrependido de ter se casado com ela, talvez o encanto realmente tenha se quebrado cedo demais. Muito tem sido escrito sobre os quatro anos que passaram juntos, mas um fato interessante é que nestes quatro anos, o período que durou o casamento com Marilyn, o dramaturgo não conseguiu escrever uma peça de teatro sequer; teria sido o caos? 

Enquanto Arthur enfrentava o bloqueio criativo, Marilyn encarava sua vida pessoal indo por água abaixo. O casamento desgastado rápido demais já se mostrava mais um fracasso. Os dias felizes do casal nos primeiros meses de 1957, quando apareceram juntos em cândidas sessões de fotos de Richard Avedon e Sam Shaw, estavam contados; em julho de 1957 Marilyn descobriu que estava esperando um filho de Arthur, infelizmente, algumas semanas mais tarde descobriu se tratar de uma gravidez ectópica. A perda do bebê serviu para lançá-la em uma das piores depressões de toda sua vida. O casamento havia sido um erro, fracassara como esposa, agora, com a gravidez mal sucedida julgava-se incapaz de ser mãe, somado a isso, havia se desinteressado pela carreira e se entregado completamente à bebida e aos comprimidos. A situação melhoraria um pouco - brevemente - quando em outubro de 1958 descobriu que estava grávida novamente, o que foi motivo de felicidade para ela, que sentiu que poderia recomeçar mais uma vez. Contudo, em 16 de dezembro, Marilyn sofreu um aborto espontâneo, um abalo que foi tão forte quanto o anterior; após se submeter a uma série de exames para determinar se era possível ou não ter filhos, foi confirmado que ela jamais poderia ser mãe. Marilyn não trabalhou em 1959, estava triste demais, uma tristeza que nunca parecia ter fim.


© Marilyn Monroe e Arthur Miller, Roxbury, 1957 (foto de Sam Shaw).

Mas afinal, quem era Marilyn Monroe para Arthur Miller? Teria sido Marilyn sua musa, ou sua vítima? Miller não é um personagem muito bem quisto entre os estudiosos da vida da atriz, porém a análise de duas obras do dramaturgo - um roteiro para o cinema e uma peça de teatro - nos dão algumas respostas acerca da visão do autor sobre sua ex-esposa. O roteiro de Os Desajustados (The Misfits) foi a única coisa que Miller escreveu durante os quatro anos que ficou casado com Marilyn, era um roteiro adaptado de um conto que ele escrevera para a revista Esquire em 1956. Ele conta em sua autobiografia Timebends (1987) que escrevera a peça como um presente para ela, bem, se foi assim mesmo, tratava-se de um presente bem amargo que Marilyn logo passou a odiar. A trama girava em torno de Roslyn Taber (Monroe) atriz que vai a Reno para obter o divórcio e hospeda-se na casa de Isabelle Steers (Thelma Ritter), que a acompanha à corte como testemunha no processo de divórcio. Comemorando num bar, conhecem Guido (Eli Wallach) e Gay (Clark Gable) um caubói velho mas bonitão por quem se apaixona. Em breve os dois se mudam para a casa que Guido está construindo. Assim como Gay, ele também se apaixona por Roslyn. Guido tem um plano de capturar alguns cavalos selvagens, chamados mustangues, impróprios para montaria por serem considerados pequenos demais, e vendê-los. Com eles nessa empreitada está Perce (Montgomery Clift) um peão de rodeio sem sorte e sem destino. Então, os três, acompanhados por Roslyn partem para o deserto de Nevada, e só quando chega lá ela descobre o destino dos animais: serão vendidos para um fabricante de ração para cachorro. Roslyn se desespera e implora a Gay que liberte os seis cavalos, inicialmente, ele se recusa e só depois de uma longa sequência corta as cordas e liberta os mustangues. O ato serve para reaproximá-los, que começam a construir um futuro juntos.

© Marilyn Monroe e Arthur Miller, Roxbury, 1957 (foto de Sam Shaw).

Marilyn achava aquela personagem, uma mulher frágil e carente, uma caricatura dela mesma. De fato, era um roteiro muito pessoal, onde Miller extraíra vários elementos da personalidade real dela e do seu relacionamento. As semelhanças são evidentes. Algumas falas de Marilyn neste filme parecem apenas repetições de sua própria história. Ela se ressentiu, como se Arthur quisesse expor seu pior lado perante todas. Mas apesar de hesitante aceitou fazer o filme, principalmente por causa do alto nível dos profissionais envolvidos na produção. Certamente se arrependeu dessa decisão durante as filmagens altamente estressantes. Os Desajustados foi um erro. O comportamento errático de Marilyn no set era atribuído à sua decadência física e psicológica, mas além disso o casamento enfim chegava ao fim. O filme que seria o último trabalho completado de Marilyn Monroe passaria em brancas nuvens - nem a direção de John Huston, nem o elenco fabuloso, nem o roteiro de Arthur Miller salvaram Os Desajustados; o filme foi retumbante fracasso. A crítica de filmes Leslie Halliwell escreveu: "Um filme pretensioso e nada atraente, de dar pena". Muitos anos depois, Arthur Miller basearia sua última peça teatral - Finishing the Picture (2004) - no período que ele e Monroe gastaram filmando Os Desajustados.


A peça Depois da Queda (After the Fall) dirigida por Elia Kazan, que estreou no Anta Washington Square Theatre, em 23 de janeiro de 1964 - menos de dois anos depois da morte de Marilyn - é um dos trabalhos mais pessoais do dramaturgo, um mergulho profundo nas experiências vividas durante o casamento fracassado com Monroe. O enredo se passa na mente de Quentin, um advogado de meia-idade que reflete sobre os relacionamentos com as três mulheres de sua vida, e como terminou o casamento com duas delas, o primeiro em divórcio, o segundo com o suicídio da esposa, uma atriz e o terceiro ainda em andamento. A atriz suicida - Maggie - era claramente baseada em Monroe, o que causou bastante mal-estar na época. Robert Crustein escreveu numa crítica na revista New Republic: "Três horas e meia de violação de bom gosto... Uma autobiografia confessional de franqueza embaraçosa... Há uma tensão misógina na peça que o autor não parece reconhecer... Ele criou um desavergonhado artigo de tabloide de fofocas, um ato de exibicionismo que faz de todos nós voyeurs,... Um fragmento infeliz de escrita dramática." A ex-primeira dama Jacqueline Kennedy, que era admiradora de Miller, também se voltou contra ele por ter traído Marilyn em sua peça Depois da Queda. Para Jackie, lealdade era a prova definitiva de caráter, e Miller falhara miseravelmente retratando Marilyn como uma vagabunda autodestrutiva que ele havia abandonado para o seu próprio bem. Depois da Queda permanece até hoje como um dos trabalhos menos populares de Miller. 


Arthur e Marilyn se divorciaram no México, em 20 de janeiro de 1961. Cerca de um ano depois, em 17 de fevereiro de 1962, Arthur se casou com Inge Morath - fotógrafa dos quadros da agência Magnum, que ele havia conhecido durante as filmagens de Os Desajustados, enquanto ela cobria a produção do filme. Menos de seis meses depois morria Marilyn Monroe. Como prova do espírito amável de Marilyn, foi o pai de Arthur, seu ex-sogro, Isadore Miller - um homem que ela amava e chamava de pai - o seu acompanhante na fatídica festa de aniversário do Presidente John F. Kennedy em maio de 1962. Foi a última vez que Isadore, então com 77 anos, viu Marilyn; ele morreria em 1964. Com Inge Morath Arthur teria ainda dois outros filhos, a cineasta e atriz Rebecca Miller e Daniel, que nasceu com síndrome de Down e foi excluído da vida diária da família pelo próprio pai, que pôs o filho à guarda de uma instituição em Roxbury e nunca o visitou (embora Inge Morath o fizesse); Miller não fala sobre Daniel nem em sua autobiografia Timebends. O dramaturgo faleceu em 10 de fevereiro de 2005, vítima de insuficiência cardíaca crônica.

Vitor Dirami

é a inquietação por excelência, está sempre em busca do "algo a mais", e espera estar levando um pouco mais de magia aos seus leitores.

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