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NARCÍSICOS, CONFUSOS E SOLITÁRIOS, EIS-NOS! [DAUFEN BACH.]


NARCÍSICOS, CONFUSOS E SOLITÁRIOS, EIS-NOS! 

Narcísicos, confusos e solitários, eis-nos! De antemão é preciso dizer que toda regra tem exceção, principalmente se fores um Surma Etíope ou um habitante da Ilha de Sentinela no Oceano Índico ou, ainda, pertencer a qualquer outro povo isolado do mundo. Creio que, embora vivam em realidades especificas, alheios ao conhecimento científico e a todas as culpas religiosas, devem ter e padecer de suas próprias confusões e crises existenciais. Mas nesse mundo moderno, de avenidas movimentadas e luzes néon, deve existir, absorto aos apitos e apelos, outras exceções. O fato é que de alguma forma, direta ou indiretamente, o nosso modo de ser, estar, compreender e atuar no mundo contemporâneo, nos fez reféns e vítimas de nossa própria criação. Somos vítimas de nós mesmos e de nossa ignorância, vítimas de nossos estilos de vida, expectativas e covardias, vítimas dos padrões e convenções da sociedade moderna, das tecnologias, vítimas da individualidade narcísica e dessa necessidade de nos bastarmos enquanto indivíduo. No meio de toda essa parafernália e complexos existenciais que nos fazem ser quem somos, a única, óbvia e completa certeza consciente é a de que existimos e, a partir daí, tentamos construir e complementar os nossos “EUS” e os nossos universos de ilusões.

Desde Aristóteles, muitos pensadores afirmam que o homem é um "ser social". Para Aristóteles, inclusive, “o homem precisa de outras pessoas porque é um ser carente. Assim, precisa de outras pessoas para se sentir pleno e feliz”. Mas quem diz que assumimos que somos carentes? Nós somos emponderados! E não importa se toda a história da evolução biológica, psíquica e intelectual dos seres humanos diga o contrário. Reitero que, quando falamos de intelecto, não estamos falando, apenas, do conhecimento no aspecto cientifico, seja qual for a ciência, mas, também, do aspecto religioso e seus dogmas. Não conseguimos entender, ainda, que para existir enquanto pessoa, é necessária outra pessoa, que você não se humaniza sem ter o outro que te humanize. Vemos o mundo em toda a sua totalidade e temos a petulância de achar que, individualmente, podemos resolver tudo, que somos fundamentais.

Freud, que ainda hoje tem muitas de suas ideias rechaçadas ou vista com desconfianças, já chamava a atenção para as barreiras narcísicas no progresso de nosso autoconhecimento. Achávamos, por exemplo, que éramos o centro do universo, os “donos da porra toda”, mas Copérnico mostrou que só éramos periferia mesmo, uma “poeirinha” debaixo do tapete da via láctea. Demoramos assimilar, mas aceitamos. Se não éramos mais o centro do Universo, pelo menos nessa periferia, com uma infinidade de seres vivos dos mais diversos reinos, éramos a espécie divinizada. Então Darwin apareceu e disse que não éramos muito diferentes dos macacos e que estávamos, como os outros seres, constantemente evoluindo. De novo, o nosso ego de ser supremo, foi ferido. Eram religiosos fundamentalistas, artistas e culturas inteiras ridicularizando a teoria, até chegar nos dias atuais e descobrirmos, através da ciência, que entre o nosso DNA e o DNA de um chimpanzé, só existe um e meio a três por cento de diferença. Como se não bastasse já não ser o centro do universo e o rei da criação, o próprio Freud mostrou que não éramos, sequer, o centro de nós próprios, pois somos governados pelo inconsciente que nos põe habitantes de nós mesmos, esse desconhecido. Depois dessas constatações, a nossa condição de seres individualmente magnânimos, superiores, senhores dos nossos destinos e os únicos capazes de definir quem somos e/ou seremos, pioraram.

Tudo bem! “Posso, talvez, aceitar que não sou senhor do universo, que faço parte da grande família dos seres vivos da Terra e que tenho um inconsciente que me determina, mas ninguém me tira a convicção de que, individualmente, eu SOU”! Pois bem, o que chamam de 4ª ferida narcísica, a teoria da grupalidade, diz que EU NÃO SOU! A compreensão do que a psiquê humana possui dimensão intersubjetiva, coloca o EU como um subproduto da experiência que o grupo promove entre seus membros, então, psicanaliticamente, eu existo, tanto no plano biológico, quanto psíquico, só porque você existe. Somos, desde a origem e ancestralidades, o resultado daquilo que nos precedeu e das relações que estabelecemos com pessoas e ambientes no nosso processo de desenvolvimento, seja de forma consciente ou inconsciente. Por exemplo, se invertêssemos as realidades e heranças geográficas, psicoemocionais e socioculturais entre Pelé e Michael Jordan, desde as suas ancestralidades, seriam eles as personalidades que são ou foram em seus esportes? A psicanálise, através de Winnicott, demonstrou através de estudos da psicologia do desenvolvimento que, NÂO.

Essa epopeia toda sobre a construção e/ou desconstrução de nossa identidade, de nossa individualidade e a continua relação das pessoas com o mundo e seus conceitos, permite tentar entender onde chegamos e como chegamos, hoje, enquanto indivíduo e sociedade, com regras, valores e princípios. Entender que na gênese do processo de autoconhecimento, não conseguimos definir com clareza o nosso espaço e que são fundamentais as interações humanas para que nos descubramos. Essa descoberta não é, apenas, para nos sentirmos sujeitos com significância e interatividade nesse orbe, mas como parte de algo maior, algo que tenha religiosidade e que permita manter vivo o sentimento de humanidade.

Copérnico, encontrou nosso lugar no universo; Darwin, independente de preceitos religiosos, encontrou nossa posição entre os outros seres vivos; Freud encontrou o outro, inconsciente, que reside em nós e Winnicott desvendou que o nosso ser e existir, não só o biológico, mas o psíquico, só é possível por causa de um outro igual a mim. Que possamos quebrar os espelhos, continuar a caminhada com o olhar mais longo e descobrir outros nossos segredos. Evoluir enquanto consciência.


Daufen Bach.
Nascido em 1973 na cidade de Ivaiporã, no Estado do Paraná. Hoje reside na cidade de Novo Mundo-MT. É educador lotado na Secretaria Estado de Educação de Mato Grosso. Ocupou cargo de Secretário Municipal de Educação e, também, Secretário Municipal de Administração. Publicou os livros de poesias: “Breves Encenações, Sobressaltos”, pela Editora Biblioteca 24 horas; “Tessituras [do intervalo entre o grito e o silêncio]”, pela plataforma Perse, "No mar de teus olhos (como jardins florescidos no outono)", pela Editora Kelps e participou de diversas antologias, entre elas a “Antologia Internacional “Planeta em Versos”, publicado pela Editora Letras em Cores. Muitos de seus poemas foram publicados em revistas, impressas e digitais, tanto nacionais, quanto internacionais. Possui poemas traduzidos e lidos em diversos países da América Latina e em alguns países da Europa, Ásia, Oceania e África. É “Cônsul dos Poetas del Mundo”, uma associação internacional de poetas com sede no Chile, desde o ano de 2007. É dono e editor de uma Revista Literária Internacional on line, intitulada Revista Biografia.

Um comentário

Ceciliabooks&livros.blogspot.com disse...

Como dizem os estadounidenses: " "it is lonely on the top" ("é solitário no topo")...a conclusão que eu tirei ao ler e reler este magnifico exemplar de análise das complexidades deste universo complicado e eventualmente solitário que é a mente humana. Somos tão inseguros na nossa insignificancia (a poeirinha astral perante uma galáxia inteira), que sequer aceitamos a idéia de uma "competição" com outros seres humanos, o que nos leva a esta carencia e solidão, cercados de outros seres, exatamente na mesma situação... fascinante!!! Obrigada, Mestre!!!